1 de fev. de 2008

Sabedoria de tartaruga

Ela me mantém em um altar e todo dia me leva flores. Já lhe disse que não gosto disso, mas ela insiste: Não se preocupe, seus defeitos acompanham sua imagem. Tranqüilizo-me por um instante e logo volto a me preocupar. Um dia as luzes cessarão, as máscaras se despregarão do rosto murcho e apagado e a falsa santa despencará do pedestal. Minha fragilidade sonsa não suportará a queda e a imagem intocada se quebrará em milhares de pedacinhos, tornando-se impossível à restauração. Será que ela me perdoará ao perceber que sou oca?

Gosto de como ela me vê. Passo a existir de forma superior a mim mesma através de seus olhos. Toda vez que nos encontramos ela coloca um gordão de ouro envolta do meu pescoço. È minha amiga, acredita na minha beleza. Ela quer me dar graça, quer me encorajar. Mas é tudo hipocrisia. A força é dela e não minha. São seus punhos e músculos que me sustentam.

Se ela continuar a agir assim, esse cordão dourado é capaz de me enforcar. Ela precisa me dar a derrota embrulhada em laços e papel crepom. Como confetes, ela precisa me jogar os defeitos na cara. Eles também são de se festejar. Só se levanta quem cai, e ela precisa me soltar. Não quero mais sua força emprestada, quero saber levantar sozinha. Sei que não é fácil, mas eu venho aprendendo como ela. Há anos assisto sua vitória conquistada a passos de tartaruga, como deve ser.

Enfim chegará o dia em que ela voltará a me enxergar inteira como outrora, só que com uma diferença: será a mesma imagem que vejo ao me olhar no espelho. Saberei então que o brilho de seus olhos ao me ver serão reflexo da minha verdade. Daí em diante não mais precisarei de adereços. Eu os serei.

Um comentário:

Anônimo disse...

"puta merda" - amei!