24 de mai. de 2008

Alma em crescimento

Minha alma está se transformando. Uma brisa leve e paciente passa pelos meus morros movimentando delicadamente, como num ballet, graos, que vao formando novas dunas, deixando outros graos, outrora tao enterrados e esquecidos, a vista. Lentamente percebo uma nova paisagem, o horizonte se alongando e o espaco a minha volta tornando-se de uma vastidao tamanha, que percebo a pequenes da vida. Minha alma encardida banha-se, delicia-se com o novo frescor. Sinto-a como um vapor quente e, a um suspiro profundo, faco-a inflar. Ainda tenho pés de chumbo, rodelas negras pousadas sob as pálpebras e a palidez de um corpo assustado. Ainda ando rápido como um perceguido, tremo na solidao da noite e tenho os olhos acuados, medrosos no passeio pelo todo. O meu eu gélido ainda me mancha de colera, abafando o ainda frágil eu do amor. Mas esses vícios e medos do corpo, ainda tao redundantes em mim, estao, mesmo que na folga da eternidade, se desmanchando. A cada rolar de grao saboreio um novo alívio. Meus ombros, queixo, costas, busto e pés já nao sofrem tanto com a pressao. Sou eu, meu amor, tornando-me grande para voce.

22 de mai. de 2008

Espetáculo

"Tres pancadas no palco. Um rufo de timbales comecou, os instrumentos de cobre explodiram em acordes, e o pano, erguendo-se, descobriu uma paisagem"

Em homenagem ao meu artísta, hoje ja tao acostumado aos palcos.
Trecho de Madame Bovary de Gustave Flaubert

6 de mai. de 2008

Fase flutuante

Estou flutuando dentro de mim. As vezes bate uma insegurança de sentir os pés longe do chão, mas na maior parte do tempo me sinto nadando em nuvens. Daqui, de cima de mim, tudo lá nos fundos fica pequenininho e como tenho medo de alturas, há horas em que as minhas pernas e mãos tremem e me coração corre. Mas ai vem o meu eu amor, pega na minha mão e me pede pra esperar dizendo: quando o vento é forte, o melhor e parar e esperar. Principalmente quando se está flutuando. Assim não saio voando, pelo contrário, aproveito a brisa que, com muito esforço, torna-se leve, refrescando meu rosto. Tenho passado por cima de mim delicadamente, flutando. Daqui de cima meus pulmões se abrem e respiro como se estivesse em meio a eucaliptos. Talvez tenha me confundido. Talvez essa seja a verdadeira insustentável leveza de ser. Eu, que antes não era, estou descorbindo um mundo no mundo e descobrindo esse mundo dentro de mim. Não quero ter medo de vida e muito menos levá-la como alguém que espera a morte. Quero goles dela que refrescam, quero banquetes dela que estufam, quero me lambuzar toda, quero nascer faminta e morrer satisfeita todos os dias. Mas quero tudo isso sem afobação... Estou flutando dentro mim, sou feita de nuvens. Mas sou filha do vento...