12 de out. de 2009

Karnevalismus


Primeiro trabalho de producao em Berlin. E nao podia ser mais divertido, mais honroso e com artistas mais seletos que estes.

9 de out. de 2009

A entrega do silencio: o crime nao aconteceu e eu sou a única testemunha

Eu preciso dizer-lhe. Eu preciso contar a alguém o meu silencio. Se nao a voce, entao a quem? Há de existir outro que receba com atencao e sem desprezo as avalanches ininterruptas que brotam do meu silencio? Nao, nao acredito. E também já nao posso ser a única a guarda-lo. Nao consigo e nao sei como e nao tenho onde. Nao me cabe mais. A dilatacao seca, o fervor escaldante. O silencio! Escorra! vaze! sangre! Tem alguém ai? Escute! Ele cresce bem aqui! No peito, nas visceras, na memória. Veja! Sinta comigo o calor-vermelhao-berrante. O terrivel isolamento que há na existencia. Quanta solidao há em existir? Todas? A de eu ser eu e mais ninguém? A de voce ser voce e mais ninguém? Como lidar com ela? O infinito acontece em mim e no entanto, ao dissecar-me, eu nada sou além de um corpo. Onde é que se deita esse silencio? Há feridas em minhas maos. Fui obrigada e ainda sou a segurar um nao nao quisto. Carrego uma voz cortante em cordas atrofiadas. Tem alguém ouvindo? Nao! Somente eu com os timpanos furados, os bracos cansados, segurando - o meu silencio. Mas vou dize-lo, quero entregá-lo: a cada virgula que vomito, como uma pausa que anseio, o indizivel se multiplica em exclamacoes. Estas sao as armadilhas do meu silencio. Cada silaba jubilada uni-se a tantas outras formando a perder-se de vista tudo o que nao se enxerga, que so eu sei, porque só eu sinto. E cade voce? Cade? Está escondido no SEU silencio. E me diz, ele tem canto doce ou soa estritende e desafinado? Taciturno, como é vil e poderoso o seu silencio. É cruel e humilhante, ele é o mais puro desamor. Eu busco frestas, respiracoes e trombo com suas muralhas frias e caladas. Proibida em sua vida. Quanta negacao. Outro dia lhe vi na mudez das fotografias. Limpo, cabelos cortados, olhar plácido alheio a dor. Vi nas desaparecidas rodelas que nao mais pousam sob seus olhos toda paz que encontrasse ao perder-se de mim. Eu era o seu terremoto. Mas nao há qualquer suspiro meu nos seus silencios. Está curado, nao é? Poda agora, como se fosse a primeira, uma nova flor. Mas vou contar-lhe um segredo. Nao houve assassinato. O que pensa finito ainda pulsa manco, ainda sangra e pinga tortuosamente no meu silencio. Este meu, enlouquecido pelo seu. Naquele janeiro, naquela última vez, pousamos os dois em camas separadas pelo fim, transformados em assassinos pela exaustao da guerra. Eu e voce, os assassinos do amor. Mas o ato falhou, eu pestanejei. Naquela noite escura e fria ouviu-se o barulho da polvora a estourar. Sobraram extensos os dois silencios. Mas nao houve morte, meu amor. Ele vive em mim. Enquanto alimeta outra boca, um manco mudo se debate de fome no meu peito. Ah! e o quanto eu nao o quero mais. Esse flagelado. Eu o sufoco e ele me sufoca. Eu o arranho e ele me arranha. E nao há morte, mesmo que eu a queira, mesmo que eu a invoque. Só o ardor de cortes e feridas dessa luta, a minha contra a dele. E eu preciso de morte. Ela é a condicao do meu nascer. Mas parece sem fim a gestacao. Sobram-me chutes no estomago, reflexos epilepticos dos silencios que guardei. Nao posso mais com esse purgatorio. Estao pagos os meus pecados. Só no ruir de algum movimento seu é que ei de cair e de morrer e de nascer novamente. Por isso, quando eu lhe pedir, nao negue o reencontro. Ele será breve e mudo. Pelos seus olhos o imperante silencio que se alonga desde aquela noite ha de cantar o canto infinito do que nao pode ser dito. E ei de ouvir todo o discurso e de receber o corpo do amor sem vida. E acreditarei, com as maos que encostam no gelado concreto, sem a sombra da dúvida que alimente a teimosa esperanca, sem o E se que nao cansa, que jaza morto. E toda secura estática que mora no meu silencio ha de escorrer em pranto. E enfim, ei de velar-lhe, chorar, cobrir-lhe, ninar-lhe e enterrar-lhe.